quinta-feira, 21 de junho de 2007

Como escrevi Vidas Secas

.... e o nordeste furioso
espalha folhas secas no chão.
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Como escrevi Vidas Secas

Em cartas e depoimentos, Graciliano Ramos explicou que o livro Vi¬das Secas nasceu da junção de textos independentes. O ponto inicial foi o episódio da morte da cachorra Baleia: “Escrevi um conto sobre a morte duma cachorra, um troço difícil, como você vê: procurei adivinhar o que se passa na alma duma cachorra. Será que há mesmo alma em cachor¬ro? Não me importo. O meu bicho morre desejando acordar num mundo cheio de preás. Exatamente o que todos nós desejamos. A diferença é que eu quero que eles apareçam antes do sono, e padre Zé Leite preten¬de que eles nos venham em sonhos, mas no fundo todos somos como a minha cachorra Baleia e esperamos preás”.
Depois de escrever “Baleia”, que saiu como conto em jornal. Graciliano explica: “Dediquei em seguida várias páginas aos donos do animal. Essas coisas foram vendidas em retalho, a jornais e revistas. E como José Olym¬pio me pedisse um livro para o começo do ano passado, arranjei outras narrações, que tanto podem ser contos como capítulos de romance. As¬sim nasceram Fabiano, a mulher, os dois filhos e a cachorra Baleia” .
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VaIe a pena assistir
• Vidas Secas. Direção de Nelson Pereira dos Santos, 1963. Premiada adaptação da obra de Graciliano Ramos, uma das grandes realizações do movimento de renovação chamado Cinema Novo, que se desen¬volveu na década de 1960.

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Citações:
Sobre a produção de Graciliano Ramos, afirma o crítico Alfredo Bosi:

O realismo de Graciliano não é orgânico nem espontâneo. É crí¬tico. O “herói” é sempre um problema: não aceita o mundo, nem os outros, nem a si mesmo. Sofrendo pelas distâncias que o separam da placenta familiar ou grupal, introjeta o conflito numa conduta de extre¬ma dureza que é a sua única máscara possível. E o romancista encontra no trato analítico dessa máscara a melhor fórmula de fixar as tensões sociais como primeiro motor de todos os comportamentos.
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo, Cultrix, 1996.

“Será um romance? É antes uma série de quadros, de gravuras em madeira entalhada com precisão e firmeza.”
Lúcia Miguel- Pereira. In Antônio Cândido. Ficção e confissão. Rio de janeiro, Editora 34, 1992.

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Sobre Vidas Secas

Vidas Secas é o único romance de Graciliano Ramos narrado em terceira pessoa, é considerada a obra-prima do regionalismo nordestino brasi¬leiro. Conta a história de uma família de retirantes que foge da seca: Fabiano, Sinhá Vitória, o Menino Mais Velho, o Menino Mais Novo e a
cadelinha Baleia.
O romance começa com o capítulo “Mudança “, e termina com o capítulo “Fuga “. Em ambos, as personagens encontram-se na mesma situação: migrando em busca de melhores condições de vida. Isso confere um aspecto circular à obra. Entre as duas secas a pequena família chega a uma fazenda abandonada onde param. Logo o dono da propriedade chega, e Fabiano passa a trabalhar ali como vaqueiro. A exploração despótica de seus ser¬viços, a truculência do poder; as humilhações cotidianas são os fios com que a trajetória deles é tecida. Eles terminam como começaram: com des¬tino incerto, caminhando sedentos e famintos, mas ainda capazes de ter esperança, já que, à exceção de Baleia, estavam todos vivos.
O título da obra pode ser justificado pela aridez do meio adverso que empurra as pessoas para uma condição de miséria, de ignorância, de animalidade. A luta cotidiana pela sobrevivên¬cia elimina qualquer possibilidade de requinte, de sentimentalismo: suas vidas são secas, des¬providas de seiva. Nem sequer dominam um vocabulário razoável. Muitas vezes comunicam-se por meio de ruídos, resmungos: “hum! hum!”, “an”, “iche!”, “ecô” etc. Paradoxalmente, a cade¬la Baleia é a personagem que apresenta maiores sutilezas de afetividade.
Apesar da penúria, esses retirantes cultivam algumas esperanças: Fabiano sonha com um lugar onde o trabalho não falte, a mulher engorde e vista saias de ramagens vis¬tosas, os meninos possam ir à escola para aprender “coisas difíceis e necessárias’. Já Sinhá Vitória sonha ter uma cama igual à do antigo patrão, seu Tomás da Bolandeira; o Menino Mais Novo queria fazer algo que impressionasse o irmão e a cachorra Baleia, desejava ser vaqueiro como o pai, admirava-lhe o facão na cintura, as esporas, as botas; o Menino Mais Velho que, como os demais, “tinha um vocabulário quase tão minguado como o do papagaio que morrera no tempo da seca’, ambicionava o domínio da palavra; Baleia sonhava com um campo verde cheio de preás gordos que pudesse caçar.
Em sua trivialidade, o conjunto de sonhos das personagens perfaz uma noção de cidadania. Eles nos remetem a direitos básicos do cidadão: trabalho, comida, vestuário, moradia, educação e outros.
O grupo de protagonistas funciona como uma metáfora de todos os milhares de pequenos núcleos de retirantes que vêm tendo, infelizmente, até hoje, o mesmo destino nefasto.

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Mudança

Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infe¬lizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros (árvore que se encontra no Nordeste brasileiro) apareceu longe, através dos galhos pelados da catinga (ou caatinga: vegeteção típica do Nordeste caracterizada por pequenas árvores espinhosas, que perdem as folhas durante o verão) rala.
Arrastaram-se para lá, devagar, sinhá Vitória com o filho mais novo escanchado (sentado a cavaleiro) no quarto e o baú de folha na cabeça, Fabiano sombrio, cambaio, o aió (bolsa feita de fibra de caroá) a tiracolo, a cuia pendurada numa correia presa ao cinturão, a espingarda de pederneira no ombro. O menino mais velho e a cachorra Baleia iam atrás.
Os juazeiros aproximaram-se, recuaram, sumiram-se. O menino mais velho pôs-se a chorar sentou-se no chão.
— Anda, condenado do diabo, gritou-lhe o pai.
Não obtendo resultado, fustigou-o com a bainha da faca de ponta. Mas o peque¬no esperneou acuado, depois sossegou, deitou-se, fechou os olhos. Fabiano ainda lhe deu algumas pancadas e esperou que ele se levantasse. Como isto não acontecesse, espiou os quatro cantos, zangado, praguejando baixo.
A catinga estendia-se, de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas. O vôo negro dos urubus fazia círculos altos em redor de bichos moribundos.
— Anda, excomungado.
O pirralho não se mexeu, e Fabiano desejou matá-lo. Tinha o coração grosso, que¬ria responsabilizar alguém pela sua desgraça. A seca aparecia-lhe como um fato neces¬sário — e a obstinação da criança irritava-o. Certamente esse obstáculo miúdo não era culpado, mas dificultava a marcha, e o vaqueiro precisava chegar, não sabia onde.
Tinham deixado os caminhos, cheios de espinho e seixos, fazia horas que pisa¬vam a margem do rio, a lama seca e rachada que escaldava os pés.
Pelo espírito atribulado do sertanejo passou a idéia de abandonar o filho naquele descampado. Pensou nos urubus, nas ossadas, coçou a barba ruiva e suja, irresoluto, examinou os arredores. Sinhá Vitória estirou o beiço indicando vagamente uma dire¬ção e afirmou com alguns sons guturais que estavam perto. Fabiano meteu a faca na bainha, guardou-a no cinturão, acocorou-se, pegou no pulso do menino, que se enco¬lhia, os joelhos encostados ao estômago, frio como um defunto. Aí a cólera desapare¬ceu e Fabiano teve pena. Impossível abandonar o anjinho aos bichos do mato. Entregou a espingarda a sinhá Vitória, pôs o filho no cangote, levantou-se, agarrou os bracinhos que lhe caíam sobre o peito, moles, finos como cambitos. Sinhá Vitória aprovou esse arranjo, lançou de novo a interjeição gutural, designou os juazeiros invisíveis.
E a viagem prosseguiu, mais lenta, mais arrastada, num silêncio grande.
[ ... ]
Miudinhos, perdidos no deserto queimado, os fugitivos agarraram-se, somaram as suas desgraças e os seus pavores. O coração de Fabiano bateu junto do coração de sinhá Vitória, um abraço cansado aproximou os farrapos que os cobriam. Resistiram à fraqueza, afastaram-se envergonhados, sem ânimo de afrontar de novo a luz dura, receosos de perder a esperança que os alentava.
Iam-se amodorrando (ficando sonolentos) e foram despertados por Baleia, que trazia nos dentes um preá. Levantaram-se todos gritando. O menino mais velho esfregou as pálpebras, afas¬tando pedaços de sonho. Sinhá Vitória beijava o focinho de Baleia, e como o focinho estava ensangüentado, lambia o sangue e tirava proveito do beijo.
Aquilo era caça bem mesquinha, mas adiaria a morte do grupo. E Fabiano que¬ria viver. Olhou o céu com resolução. A nuvem tinha crescido, agora cobria o morro inteiro. Fabiano pisou com segurança, esquecendo as rachaduras que lhe estragavam os dedos e os calcanhares.
Sinhá Vitória, remexeu no baú, os meninos foram quebrar urna haste de alecrim para fazer um espeto. Baleia, o ouvido atento, o traseiro em repouso e as pernas da frente erguidas, vigiava, aguardando a parte que lhe iria tocar, provavelmente os ossos do bicho e talvez o couro.
Fabiano tomou a cuia, desceu a ladeira, encaminhou-se ao rio seco, achou no bebedouro dos animais um pouco de lama. Cavou a areia com as unhas, esperou que a água marejasse e, debruçando-se no chão, bebeu muito. Saciado, caiu de papo para cima, olhando as estrelas, que vinham nascendo. Uma, duas, três, quatro, havia mui¬tas estrelas, havia mais de cinco estrelas no céu. O poente cobria-se de cirros (nuvens altas) — e uma alegria doida enchia o coração de Fabiano.
Pensou na família, sentiu fome. Caminhando, movia-se como uma coisa, para bem dizer não se diferençava muito da bolandeira de seu Tomás. Agora, deitado, aper¬tava a barriga e batia os dentes. Que fim teria levado a bolandeira (roda grande e dentada dos engenhos de cana-de-açúcar) de seu Tomás?
Olhou o céu de novo. Os cirros acumulavam-se, a lua surgiu, grande e branca. Certamente ia chover.
Seu Tomás fugira também, com a seca, a bolandeira estava parada. E ele, Fabiano, era como a bolandeira. Não sabia por quê, mas era. Uma, duas, três, havia mais de cinco estrelas no céu. A lua estava cercada de um halo cor de leite. Ia chover. Bem. A catinga ressuscitaria, a semente do gado voltaria ao curral, ele, Fabiano, seria o vaqueiro daquela fazenda morta. Chocalhos de badalos de ossos animariam a soli¬dão. Os meninos, gordos, vermelhos, brincariam no chiqueiro das cabras, sinhá Vitória vestiria saias de ramagens vistosas. As vacas povoariam o curral. E a catinga ficaria toda verde.
[ ... ]
Eram todos felizes. Sinhá Vitória vestiria uma saia larga de ramagens. A cara murcha de sinhá Vitória remoçaria, as nádegas bambas de sinhá Vitória engrossariam, a roupa encarnada de sinhá Vitória provocaria a inveja das outras caboclas.
A lua crescia, a sombra leitosa crescia, as estrelas foram esmorecendo naquela brancura que enchia a noite. Uma, duas, três, agora havia poucas estrelas no céu. Ali perto a nuvem escurecia o morro.
[ ... ]

Questões:
1. Fabiano chega a considerar a hipótese de abandonar seu filho à própria sorte. É um momento extremo da narrativa, em que sua condição de animal torna-se imperativa: é preciso chegar, é preciso sobreviver. Em qual momento ele se resgata como ser humano?
R: No momento em que volta atrás em sua decisão de abandonar o pequeno e retorna para pegá-lo.

2. “O coração de Fabiano bateu junto do coração de sinhá Vitória, um abraço cansado aproximou farrapos que os cobriam. Resistiram à fraqueza, afastaram-se envergonhados, sem ânimo de afrontar de novo a luz dura, receosos de perder a esperança que os alentava.” Nesse fragmen¬to, Fabiano e sinhá Vitória envergonham-se pela “fraqueza” do abraço, afastando-se “envergo¬nhados”. Explique por quê.
R: Porque o momento era agudo, não havia espaço para a fraqueza” dos sentimen¬tos. O abraço era uma manifestação de fraqueza e, do ponto de vista deles, com¬pletamente inadequada para a ocasião.

3. Como o narrador demonstra a condição emotiva e humanizada conferida à cadela Baleia?
R: Baleia é uma cadela, está absolutamente faminta como os outros, mas, ao ca¬çar o preá, não o come sozinha, como seria natural que um bicho fizesse, guia¬do pelos seus instintos. Ela entrega a caça para que seja dividida com os de¬mais.

4. Cite uma passagem do fragmento que exemplifique a situação de animalidade em que as per¬sonagens se encontravam.
R: Sinhá Vitória beijava o focinho de Baleia, e como o focinho estava ensangüentado, lambia o sangue e tirava proveito do beijo.”

5. Destaque do texto índices de que as coisas estão por melhorar.
R: ‘[los juazeiros alargavam duas manchas verdes”’ “O poente cobria-se de cirros”; “A lua estava cercada de um halo cor de leite. la chover.”


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Contas

[ ... ]
Ora, daquela vez, como das outras, Fabiano ajustou o gado, arrependeu-se, enfim deixou a transação meio apalavrada e foi consultar a mulher. Sinhá Vitória man¬dou os meninos para o barreiro, sentou-se na cozinha, concentrou-se, distribuiu no chão sementes de várias espécies, realizou somas e diminuições. No dia seguinte Fabiano voltou à cidade, mas ao fechar o negócio notou que as operações de sinhá Vitória, como de costume, diferiam das do patrão. Reclamou e obteve a explicação habitual: a diferença era proveniente de juros.
Não se conformou: devia haver engano. Ele era bruto, sim senhor, via-se perfei¬tamente que era bruto, mas a mulher tinha miolo. Com certeza havia um erro no papel do branco. Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu os estribos. Passar a vida intei¬ra assim no toco, entregando o que era dele de mão beijada! Estava direito aquilo? Trabalhar como negro e nunca arranjar carta de alforria!
O patrão zangou-se, repeliu a insolência, achou bom que o vaqueiro fosse pro¬curar serviço noutra fazenda.
Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou. Bem, bem. Não era preciso barulho não. Se havia dito palavra à-toa, pedia desculpa. Era bruto, não fora ensinado. Atrevimento não tinha, conhecia o seu lugar. Um cabra. Ia lá puxar questão com gente rica? Bruto, sim senhor, mas sabia respeitar os homens. Devia ser ignorância da mulher, provavelmente devia ser ignorância da mulher. Até estranhara as contas dela. Enfim, como não sabia ler (um bruto, sim senhor), acreditara na sua velha. Mas pedia desculpa e jurava não cair noutra.
O amo abrandou, e Fabiano saiu de costas, o chapéu varrendo o tijolo. Na porta, virando-se, enganchou as rosetas das esporas, afastou-se tropeçando, os sapatões de couro cru batendo no chão como cascos.
Foi até a esquina, parou, tomou fôlego. Não deviam tratá-lo assim. Dirigiu-se ap quadro lentamente. Diante da bodega de seu Inácio virou o rosto e fez uma curva larga. Depois que acontecera aquela miséria, temia passar ali, Sentou-se numa calçada, tirou do bolso o dinheiro, examinou-o, procurando adivinhar quanto lhe tinham furtado. Não podia dizer em voz alta que aquilo era um furto, mas era.Tomavam-lhe o gado quase de graça e ainda inventavam juro. Que juro! O que havia era safadeza.
_ Ladroeira.
Nem lhe permitiam queixas. Porque reclamara, achara a coisa uma exorbitância, o branco se levantara furioso, com quatro pedras na mão. Para que tanto espalhafato?
_ Hum! Hum!
Recordou-se do que lhe sucedera anos atrás, antes da seca, longe. Num dia de apuro recorrera ao porco magro que não queria engordar no chiqueiro e estava reservado às despesas do Natal: matara-o antes de tempo e fora vendê-lo na cidade. Mas o cobrador da prefeitura chegara com o recibo e atrapalhara-o. Fabiano fingira-se desentendido: não compreendia nada, era bruto. Como o outro lhe explicasse que, para vender o porco, devia pagar imposto, tentara convencê-lo de que ali não havia porco, havia quartos de porco, pedaços de carne. O agente se aborrecera, insultara-o, e Fabiano se encolhera. Bem, bem. Deus o livrasse de história com o governo. Julgava que podia dispor dos seus troços. Não entendia de imposto.
_ Um bruto, está percebendo?
Supunha que o cevado era dele. Agora a prefeitura tinha uma parte, estava acabado. Pois ia voltar para casa e comer a carne. Podia comer a carne? Podia ou não podia? O funcionário batera o pé agastado e Fabiano se desculpara, o chapéu de couro na mão, o espinhaço curvo:
_ Quem foi que disse que eu ia brigar? O melhor é a gente acabar com isso.
Despedira-se, metera a carne no saco e fora vendê-la noutra rua, escondido. Mas, atracado pelo cobrador, gemera no imposto e na multa. Daquele dia em diante não criara mais porcos. Era perigoso criá-los.

Questões:
6. Sinhá Vitória errou nas contas?
R: Não, o patrão estava enganando Fabiano, aproveitando-se de sua ignorância

7. O narrador vale-se do discurso indireto livre em várias passagens do fragmento. Defina esse tipo de discurso e exemplifique com alguma passagem do texto.
R: O discurso indireto livre é aquele em que ocorre a fusão da fala do narrador e da personagem, revelando o fluxo de consciência da personagem: “devia haver engano. Ele era bruto, sim senhor, via-se perfeitamente que era bruto, mas a mulher tinha miolo. Com certeza havia um erro no papel do branco”; “achou bom que o vaqueiro fosse procurar serviço noutra fazenda”; “Tomavam-lhe o gado quase de graça e ainda inventavam juro. Que juro! O que havia era safadeza”.

8. Dê índices da submissão social de Fabiano.
R: Os índices são vários: “o chapéu varrendo o tijolo”~ o sair de costas, tropeçando nas esporas das botas; a retratação diante do patrão, mesmo sabendo ter ra¬zão, o “espinhaço curvo” etc.

9. Ainda que ignorante e temente à lei, Fabiano procura enganar o fiscal da prefeitura, safando-se da primeira multa e indo vendes a carne em outro lugar. Quando flagrado, saiu-se mal. Ele tirou a conclusão correta sobre o episódio? Explique:
R: Não. Fabiano concluiu que era perigoso criar porcos e não que deveria tirar a licença, ou vender a mercadoria de maneira mais discreta, fugindo do fiscal.

10. O poder de pressão do patrão para forçar Fabiano a aceitar suas con¬tas resume-se numa frase do texto. Qual?


11. Que recurso usou o autor para destacar o caráter rústico de Fabiano, rebaixando-o quase à condição de um animal?


12. No começo do texto, o dono da fazenda onde Fabiano trabalha é chama¬do de patrão; logo em seguida, porém, ele passa a ser chamado de amo. Considerando o significado dessas duas palavras e a condição de Fabia¬no, o que revela essa mudança na forma de se tratar o dono da fazenda?

13. “Com certeza havia um erro no papel do branco.” Considerando seus conhecimentos de História do Brasil, que conotação assumiu a palavra branco em nossa cultura? E por que eIa é usada com referência ao dono da fazenda, nessa passagem? (Não se esqueça de que Fabiano, em outra passagem do livro, é descrito como um homem que tem “a barba ruiva, os olhos azuis”; portanto, ele também é um homem branco.)
R: Preconceito

14. O texto mostra Fabiano em duas situações de conflito: uma com o patrão e outra com o cobrador da prefeitura. Considerando o comportamento de Fabiano, o que há em comum nas duas situações?
R: São situações em que Fabiano está sendo ludibriado e roubado. Em ambos os casos. ele tenta defen¬der-se, mas não consegue.

15. O que o governo representa para Fabiano?
R; Um poder inquestionável, que está acima de tudo.

16. Que adjetivo, repetido várias vezes, destaca a rusticidade de Fabiano. cujas reações são freqüentemente associadas às de um animal?
R: Bruto.

17. Que características aproximam esse texto dos de Jorge Amado e Rachel de Queiroz, para que todos sejam incluídos na linha neo-realista da segunda fase do Modernismo?
R: Espera-se que os alunos percebam que, em todos eles, ocorre a denúncia da exploração do homem do povo, do trabalhador humilde, que sofre nas mãos dos poderosos.
Acompanhe o relato do episódio de sua morte, por decisão do próprio sertanejo, que não su¬porta mais vê-la sofrer


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Fuga

A vida na fazenda se tornava difícil. Si¬nhá Vitória benzia-se tremendo, manejava o rosário, mexia os beiços rezando rezas desespe¬radas. Encolhido no banco do copiar [varanda, alpendre], Fabiano espiava a caatinga amarela, onde as folhas secas se pulverizavam, trituradas pelos rede¬moinhos, e os garranchos [ramo totuoso de árvore] se torciam, negros, torrados. No céu azul as últimas arribações [tipo de ave] ti¬nham desaparecido. Pouco a pouco os bichos se finavam, devorados pelo carrapato. E Fabia¬no resistia, pedindo a Deus um milagre.
Mas quando a fazenda se despovoou, viu que tudo estava perdido, combinou a viagem com a mulher, matou o bezerro morrinhento [enfraquecido] que possuíam, salgou a carne, largou-se com a família, sem se despedir do amo. Não pode¬ria nunca liquidar aquela dívida exagerada. Só lhe restava jogar-se ao mundo, como negro fugido.
Saíram de madrugada. Sinhá Vitória meteu o braço pelo buraco da parede e fechou a porta da frente com a taramela. Atravessaram o pátio, deixaram na escuridão o chiqueiro e o curral, vazios, de porteiras abertas, o carro de bois que apodrecia, os juazeiros. Ao passar junto ás pedras onde os meninos atiravam co¬bras mortas, sinhá Vitória lembrou-se da cachor¬ra Baleia, chorou, mas estava invisível e nin¬guém percebeu o choro.
Desceram a ladeira, atravessaram o rio seco, tomaram rumo para o sul. Com a fresca da madrugada, andaram bastante, em silêncio, quatro sombras no caminho estreito coberto de seixos
[pedra solta] miúdos — os meninos à frente, con¬duzindo trouxas de roupa, sinhá Vitória sob o baú de folha [metal] pintada e a cabaça de água, Fabiano atrás, de facão de rasto e faca de pon¬ta, a cuja pendurada por uma correia amarra¬da ao cinturão, o aió a tiracolo, a espingarda de pederneira [espingarda de caça na qual o mecanismo se encontra no exterior da arma] num ombro, o saco da matalota¬gem [provisão de mantimentos] no outro. Caminharam bem três léguas antes que a barra do nascente aparecesse.
Fizeram alto. E Fabiano depôs no chão parte da carga, olhou o céu, as mãos em pala na testa. Arrastara-se até ali na incerteza de que aquilo fosse realmente mudança. Retardara-se e repreendera os meninos, que se adiantavam, aconselhara-os a poupar forças. A verdade é que não queria afastar-se da fazenda. A viagem parecia-lhe sem jeito, nem acreditava nela. Preparara-a lentamente, adiara-a, tornara a prepará-la, e só se resolvera a partir quando estava definitivamente perdido. Podia continuar a viver num cemitério? Nada o prendia àquela terra dura, acharia um lugar menos seco para enterrar-se. Era o que Fabiano dizia, pensando em coisas alheias: o chiqueiro e o curral, que precisavam conserto, o cavalo de fábrica, bom companheiro, a água alazã, as catingueiras, as panelas de losna, as pedras da cozinha, a cama de varas. E os pés dele esmoreciam, as alpercatas calavam-se na escuridão. Seria necessário largar tudo? As alpercatas chiavam de novo no caminho coberto de seixos.
Agora Fabiano examinava o céu, a bar¬ra que tingia o nascente, e não queria conven¬cer-se da realidade. Procurou distinguir qual¬quer coisa diferente da vermelhidão que todos os dias espiava, com o coração aos baques. As mãos grossas, por baixo da aba curva do cha¬péu, protegiam-lhe os olhos contra a clarida¬de e tremiam.
Os braços penderam, desanimados.
— Acabou-se.
Antes de olhar o céu, já sabia que ele estava negro num lado, cor de sangue no ou¬tro, e ia tornar-se profundamente azul. Estre¬meceu como se descobrisse uma coisa muito ruim.(...)
Afastaram-se rápidos, como se alguém os tangesse, e as alpercatas de Fabiano iam quase tocando os calcanhares dos meninos. A lembrança da cachorra Baleia picava-o, intolerável. Não podia livrar-se dela. Os mandacarus e os alastrados vestiam a campina, espinho, só espinho. E Baleia aperreava-o. Precisava fugir daquela vegetação inimiga. (...)
— O mundo é grande.
Realmente para eles era bem pequeno, mas afirmavam que era grande — e marchavam, meio confiados, meio inquietos. Olhavam os meninos que olhavam os montes distantes, onde havia seres misteriosos. Em que estariam pensando? zumbiu sinhá Vitória. Fabiano estranhou a pergunta e rosnou uma objeção. Menino é bicho miúdo, não pensa. Mas sinhá Vitória renovou a pergunta — e a certeza do marido abalou-se. Ela devia ter razão. Tinha sempre razão. Agora desejava saber que iriam fazer os filhos quando crescessem. ( ... )
Pouco a pouco uma vida nova, ainda confusa, se foi esboçando. Acomodar-se-iam num sítio pequeno, o que parecia difícil a Fabiano, criado solto no mato. Cultivariam um pedaço de terra. Mudar-se-iam depois para uma cidade, e os meninos freqüentariam escolas, seriam diferentes deles. Sinhá Vitória esquentava -se. Fabiano ria, tinha desejo de esfregar as mãos agarradas à boca do saco e à coronha da espingarda de pederneira.
Não sentia a espingarda, o saco, as pedras miúdas que lhe entravam nas alpercatas, o cheiro de carniças que empestavam o caminho. As palavras de sinhá Vitória encantavam-no. Iriam para diante, alcançariam uma terra desconhecida. Fabiano estava contente e acreditava nessa terra, porque não sabia como ela era nem onde era. Repetia docilmente as palavras de sinhá Vitória, as palavras que sinhá Vitória murmurava porque tinha confiança nele. E andavam para o sul, metidos naquele sonho. Uma cidade grande, cheia de pessoas fortes. Os meninos em escolas, aprendendo coisas difíceis e necessárias. Eles dois velhinhos, acabando-se como uns cachorros, inúteis, aça- bando-se como Baleia. Que iriam fazer? Retardaram-se, temerosos. Chegariam a uma terra desconhecida e civilizada, ficariam presos nela. E o sertão continuaria a mandar gente para lá. O sertão mandaria para a cidade homens fortes, brutos, como Fabiano, sinhá Vitória e os dois meninos.

Questões:
18. Que motivos levaram Fabiano e a família a deixar a fazenda em que trabalhavam?
R: O flagelo da seca; dívida com o patrão que Fabiano julga exagerada. .

19. Que esperança a aparência do céu tirou de Fabiano após a primeira caminhada?
R: A esperança de que viesse a chuva.

20. Que mensagem contém a fala “Acabou-se” com relação às expectativas de Fabiano?
R: É a confirmação de que não há mesmo esperança e ele deve partir.

21. A cachorra Baleia, muito doente em conseqüência da fome e da seca, fora sacrificada por Fabiano. Por que esse fato teria deixado marcas tão profundas na família?
R: Porque era um prenúncio do que poderia ocorrer com eles mesmos.

22. “O mundo é grande.” Por que o narrador discordaria dessa opinião de Fabiano? Localize a frase que comprova sua resposta.
R: Porque Fabiano e a família não encontrariam meios de sobreviver a não ser em seu ambiente. “Realmente para eles era bem pequeno...
23. “Pouco a pouco uma vida nova, ainda confusa, se foi esboçando.”
a) Que vida nova era essa?
R: Uma vida livre da seca.

b) Essa situação era real? Justifique.
R: Não, pois todo o sertão estava na mesma situação e, além disso, os recursos de Fabiano e da família eram parcos.

c) Por que era “ainda confusa” essa situação?
R: Porque, de palpável, eles ainda não haviam encontrado nada.

24. Por que as idéias de sinhá Vitória fizeram com que Fabiano esquecesse os percalços da
caminhada?
R: Porque a esperança de dias melhores faziam-no esquecer os percalços do caminho.

25. Os três últimos períodos do texto expressam a opinião do narrador ou das personagens?
Justifique e comprove.
R: Expressam a opinião do narrador, cuja experiência já acumulava outras histórias como a da fa¬mília de Fabiano. Basta observar que os três períodos trazem uma previsão do que poderá ocor¬rer com as personagens.

26. Em que os recursos descritivos enriqueceram a narração desse episódio?
R: Ao transmitir uma idéia mais próxima sobre a realidade da vida das vítimas da seca.

27. Identifique a comparação em que Fabiano se nivela a um escravo. Em seguida, explique o que se pode entender por “escravidão” naquele contexto.
R: “... como um negro fugido.” A escravidão se refere às dívidas que normalmente os trabalhadores rurais contraem com os patrões e que dificilmente conseguem pagar.

28. “[ ... ] matou o bezerro morrinhento que possuíam, salgou a carne ...” Valendo-se de conhecimentos científicos, explique a providência que aparece em destaque:
R: salga-se a carne para evitar deterioração. O sal (cloreto de sódio) eleva fortemente o potencial osmótico da carne. Assim, ao entrar em contato com a carne salgada, bactérias e fungos decompositores perdem para ela, por osmose, grande parte da água das suas células, o que reduz seu metabolismo, e faz com que o alimento se conserve por mais tempo

29. Releia o quarto parágrafo do texto. Que figura no quadro Retirantes de Portinari (ao lado), equivale a essa descrição de Sinhá Vitória?
R: a figura central do quadro carrega também algo sobre a cabeça .

30. No terceiro parágrafo predomina a coordenação ou a subordinação? Explique.
R: predomina a coordenação. Há apenas três orações subordinadas: duas adjetivas e uma reduzida temporal.

31. Basicamente, ser cidadão é gozar do domínio sobre o próprio corpo, ter acesso a um salário condizente para promover a própria vida, usufruir do direito à educação, à saúde, à habitação e ao lazer. Nessa perspectiva, Fabiano pode ser considerado um cidadão?
R: Não, pois a personagem não goza de um único direito entre os apontados

32. O universo de qualquer trabalhador apresenta características próprias, identifique no parágrafo iniciado por “ fizeram alto. E ... e finalizado em ... coberto de seixos”.
a. elementos que identifiquem o universo de atuação de Fabiano:
R: chiqueiro, curral, o cavalo, a égua, as catingueiras.

b. Fabiano não é proprietário de nenhum dos instrumentos com que trabalha. Assim sendo, sua relação com o meio é estável ou provisória?
R: a ligação de Fabiano com o meio é transitória e instável.

c. Que trecho do fragmento mostra a relação do Fabiano trabalhador com os instrumentos de seu trabalho?
R: “... pensando em coisas alheias.”

d. Fabiano é definido mais como vaqueiro ou como retirante?
R: a personagem se define como retirante pela natureza de sua ligação com o meio.

e. Transcreva as metonímias que expressam, em ações, a hesitação de Fabiano.
R: “E os pés dele amolecem, as alpercatas calavam-se na escuridão [ ... ] as alpercatas chiavam de novo no caminho coberto de seixos.
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Baleia

A cachorra Baleia estava para morrer. Tinha emagrecido, o pêlo caíra-lhe em vários pontos, as costelas avultavam num fundo róseo, onde manchas escuras supuravam e san¬gravam, cobertas de moscas. As chagas da boca e a inchação dos beiços dificultavam-lhe a comida e a bebida.
( ... )
Então Fabiano resolveu matá-la. Foi buscar a espingarda de pederneira, lixou-a, lim¬pou-a.com o saca-trapo e fez tenção de carregá-la bem para a cachorra não sofrer muito.
Sinhá Vitória fechou-se na camarinha, rebocando os meninos assustados, que adivi¬nhavam desgraça e não se cansavam de repetir a mesma pergunta:
—Vão bulir com a Baleia?
( ... )
Ela era como uma pessoa da família: brincavam juntos os três, para bem dizer não se diferençavam, rebolavam na areia do rio e no estrume fofo que ia subindo, ameaçava co¬brir o chiqueiro das cabras.
( ... )
Fabiano percorreu o alpendre, olhando a baraúna e as porteiras, açulando um cão in¬visível contra animais invisíveis:
— Ecô! ecô!
Em seguida entrou na sala, atravessou o corredor e chegou à janela baixa da cozinha. Examinou o terreiro, viu Baleia coçando-se a esfregar as peladuras no pé-de-turco, levou a espingarda ao rosto. A cachorra espiou o dono desconfiada, enroscou-se no tronco e foi-se desviando até ficar no outro lado da árvore, agachada e arisca, mostrando apenas as pupi¬las negras. Aborrecido com esta manobra, Fabiano saltou a janela, esgueirou-se ao longo da cerca do curral, deteve-se no mourão do canto e levou de novo a arma ao rosto. Como o animal estivesse de frente e não apresentasse bom alvo, adiantou-se mais alguns passos. Ao chegar às catingueiras, modificou a pontaria e puxou o gatilho. A carga alcançou os quartos traseiros e inutilizou uma perna de Baleia que se pôs a latir desesperadamente.
Ouvindo o tiro e os latidos, sinhá Vitória pegou-se à Virgem Maria e os meninos rola¬ram na cama, chorando alto. Fabiano recolheu-se.
A Baleia fugiu precipitada, rodeou o barreiro, entrou no quintalzinho da esquerda, passou rente aos craveiros e às panelas de losna, meteu-se por um buraco da cerca e ga¬nhou o pátio, correndo em três pés. Dirigiu-se ao copiar, mas temeu encontrar Fabiano e afastou-se para o chiqueiro das cabras. Demorou-se aí um instante, meio desorientada, saiu depois sem destino, aos pulos.
Defronte do carro de bois faltou-lhe a perna traseira. E, perdendo muito sangue, an¬dou como gente, em dois pés, arrastando com dificuldade a parte posterior do corpo. Quis recuar e esconder-se debaixo do carro, mas teve medo da roda.
Encaminhou-se aos juazeiros. Sob a raiz de um deles havia uma barroca macia e fun¬da. Gostava de espojar-se ali: cobria-se de poeira, evitava as moscas e os mosquitos, e quando se levantava, tinha folhas secas e gravetos colados às feridas, era um bicho diferen¬te dos outros.
Caiu antes de alcançar essa cova arredada. Tentou erguer-se, endireitou a cabeça e es¬tirou as pernas dianteiras, mas o resto do corpo ficou deitado de banda. Nesta posição tor¬cida, mexeu-se a custo, ralando as patas, cravando as unhas no chão, agarrando-se nos sei¬xos miúdos. Afinal esmoreceu e aquietou-se junto às pedras onde os meninos jogavam co¬bras mortas.
( ... )
(RAMOS, Graciliano. Vidas secas. São Paulo, Record, 1983.)


O capítulo Baleia foi, inicialmente, um conto, mas mantém grande unidade temática com o romance. Em Vidas secas, temos personagens que giram em círculo, procurando a subsistência. Terminam emigrando para o Sul, como milhões de nordestinos.

33. Relendo o capítulo acima, escolha entre os adjetivos propostos os que você em¬pregaria para definir o estilo de Graciliano Ramos: conciso, direto, objetivo, realista, oblíquo, derramado, romântico.
R: Espera-se que o aluno escolha: conciso, di¬reto, objetivo, realista.

34. Considere o seguinte trecho:
A cachorra Baleia estava para morrer. Tinha emagrecido, o pêlo caíra-lhe em vários pontos, as costelas avultavam num fundo róseo, onde manchas escuras supuravam e san¬gravam, cobertas de moscas. As chagas da boca e a inchação dos beiços dificultavam-lhe a comida e a bebida.

O parágrafo transcrito é constituído por três períodos. Qual é a relação que se estabelece entre eles, na ordem em que estão?
R: O primeiro período faz uma afirmação geral, posteriormente explicada pelos outros dois. Caso o primeiro período viesse depois, no fim, o texto seria entendido, mas a riqueza de relação que existe entre eles — tal como aparecem — se perderia

35. Observando-se detalhadamente o parágrafo transcrito, que tipo de descrição faz o narrador? Considere elementos como detalhe e enfoque global.
R: O narrador faz uma descrição bem real, con¬creta, do estado da cachorra Baleia, Pode-se até enquadrar essa descrição na estética naturalista


36. Considere o seguinte parágrafo:
Naquele momento Fabiano lhe causava grande admiração. Metido aos couros, de perneiras, gibão e guarda-peito, era a criatura mais importante do mundo. As rosetas das esporas dele tilintavam no pátio; as abas do chapéu jogado para trás, preso debaixo do queixo pela correia, aumentavam-lhe o rosto queimado, faziam-lhe um círculo enorme em torno da cabeça.

37. Onde está a força do parágrafo? Por quê?
R: A força do parágrafo está na ordem em que aparecem os períodos: primeiro um, curto; de¬pois outros, que explicam o primeiro. Ao uti¬lizar um período curto no relato, o narrador aumenta a possibilidade de visualizar Fabiano.
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Fabiano curou no rasto a bicheira da novilha raposa. Leva¬va no aió um frasco de creolina, e se houvesse achado o ani¬mal, teria feito o curativo ordinário. Não o encontrou, mas su¬pôs distinguir as pisadas dele na areia, baixou-se, cruzou dois gravetos no chão e rezou. Se o bicho não estivesse morto, vol¬taria para o curral, que a oração era forte.
Cumprida a obrigação, Fabiano levantou-se com a consci¬ência tranqüila e marchou para casa. Chegou-se à beira do rio. A areia fofa cansava-o, mas ali, na lama seca, as alpercatas dele faziam chape-chape, os badalos dos chocalhos que lhe pesavam no ombro, pendurados em correias, batiam surdos. A cabeça inclinada, o espinhaço curvo, agitava os braços para a direita e para a esquerda. Esses movimentos eram inúteis, mas o vaqueiro, o pai do vaqueiro, o avô e outros antepassados mais antigos haviam-se acostumado a percorrer veredas, afastando o mato com as mãos. E os filhos já começavam a reproduzir o gesto hereditário.
Chape-chape. Os três pares de alpercatas batiam na lama rachada, seca e branca por cima, preta e mole por baixo. A lama da beira do rio, calcada pelas alpercatas, balançava.
A cachorra Baleia corria na frente, o focinho arregaçado, procurando na caatinga a novilha raposa.
Fabiano ia satisfeito. Sim senhor, arrumara-se. Chegara naquele estado, com a família morrendo de fome, comendo raízes. Caíra no fim do pátio, debaixo de um juazeiro, depois tomara conta da casa deserta. Ele, a mulher e os filhos tinham-se habituado à camarinha escura, pareciam ratos — e a lembrança dos sofrimentos passados esmorecera.
Pisou com firmeza no chão gretado, puxou a faca de ponta, esgaravatou as unhas sujas. Tirou do aió um pedaço de fumo, picou-o, fez um cigarro com palha de milho, acendeu-o ao binga, pôs-se a fumar regalado.
— Fabiano, você é um homem, exclamou em voz alta.
Conteve-se, notou que os meninos estavam perto, com certeza iam admirar-se ouvindo-o falar só. E, pensando bem, ele não era homem: era apenas um cabra ocupado em guardar coisas dos outros. Vermelho, queimado, tinha os olhos azuis, a barba e os cabelos ruivos, mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais alheios, descobria-se, encolhia-se na presença dos brancos e julgava-se cabra.
Olhou em tomo, com receio de que, fora os meninos, alguém tivesse percebido a frase imprudente. Cor¬rigiu-a, murmurando:
— Você é um bicho, Fabiano.
Isto para ele era motivo de orgulho. Sim senhor, um bicho, capaz de vencer dificuldades.
Chegara naquela situação medonha — e ali estava, forte, até gordo, fumando o seu cigarro de palha.
— Um bicho, Fabiano.
Era. Apossara-se da casa porque não tinha onde cair morto, passara uns dias mastigando raiz de imbu e sementes de mucunã. Viera a trovoada. E, com ela, o fazendeiro, que o expulsara. Fabiano fizera-se desenten¬dido e oferecera os seus préstimos, resmungando, coçando os cotovelos, sorrindo aflito. O jeito que tinha era ficar. E o patrão aceitara-o, entregara-lhe as marcas de ferro.
Agora Fabiano era vaqueiro, e ninguém o tiraria dali. Aparece¬ra como um bicho, entocara-se como um bicho, mas criara raízes, estava plantado. Olhou as quipás, os mandacarus e os xique-xiques. Era mais forte que tudo isso, era como as catingueiras e as baraúnas. Ele, Sinhá Vitória, os dois filhos e a cachorra Baleia estavam agar¬rados à terra.
Chape-chape. As alpercatas batiam no chão rachado. O corpo do vaqueiro derreava-se, as pernas faziam dois arcos, os braços moviam-se desengonçados. Parecia um macaco.
Entristeceu. Considerar-se plantado em terra alheia! Engano. A sina dele era correr mundo, andar para cima e para baixo, à toa, como judeu errante. Um vagabundo empurrado pela seca. Achava-se ali de passagem, era hóspede. Sim senhor, hóspede que demora¬va demais, tomava amizade à casa, ao curral, ao chiqueiro das ca¬bras, ao juazeiro que os tinha abrigado uma noite.
Deu estalos com os dedos. A cachorra Baleia, aos saltos, veio lamber-lhe as mãos grossas e cabeludas. Fabiano recebeu a carícia, enterneceu-se:
— Você é um bicho, Baleia.
Vivia longe dos homens, só se dava bem com animais. Os seus pés duros quebravam espinhos e não sentiam a quentura da terra. Montado, confundia-se com o cavalo, grudava-se a ele. E falava uma linguagem cantada, monossilábica e gutural, que o companheiro entendia. A pé, não se agüentava bem. Pendia para um lado, para o outro lado, cambaio, torto e feio. Ás vezes utilizava nas relações com as pessoas a mesma língua com que se dirigia aos brutos — exclamações, onomatopéias. Na verdade falava pouco. Admirava as palavras compridas e difíceis da gente da cidade, tentava reproduzir algumas, em vão, mas sabia que elas eram inúteis e talvez perigosas.

38. Interprete as duas afirmações: “Fabiano, você é um homem” e “Você é um bicho, Fabiano”.
R: Uma inversão de valores: o homem dá uma patada; a cachorra tem perna, e não pata.

39. Destaque e comente uma passagem onde se percebe a total integração do homem com o meio físico e com o mundo animal.
R: A zoomorfização do homem e a antropomorfização da cadela Baleia devem ser entendidas
como o nivelamento do homem com os ani¬mais, no fundo, todos bichos.

40. Observe que em duas passagens a palavra inútil aparece associada ao fato de Fabiano reproduzir alguns gestos e atitudes. Comente-as.
R:




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Questões gerais:

1. (Fuvest-SP)
“E, pensando bem, ele não era homem: era apenas um cabra ocupado em guardar coisas dos outros. Vermelho, queimado, tinha os olhos azuis, a barba e o cabelo ruivos: mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais alheios, descobria-se, encolhia-se na presença dos brancos e julgava-se cabra.”
Este é o retrato de Fabiano, do livro Vidas Secas, de Graciliano Ramos.
a) Por que o autor enumera os caracteres físicos de Fabiano?
R: Para diferenciar Fabiano de um “cabra”

b) Que sentido tem a palavra cabra no texto?
R: “cabra” se refere a um indivíduo mestiço de mulato e negro. É o ser oprimido, subalterno, é comparado a um bicho e sem destaque social/

2. Sobre o Neo-realismo no Brasil.
a) qual é a temática predominante?
b) em qual época literária aconteceu?
c) cite o(s) ano(s) em que esse tema predominante foi publicado.
d) cite os autores referentes à prosa neo-relista.

3. VUNESP-SP
As 4 questões seguintes têm como mote o Princípio 3º da Declaração Universal dos Direitos da Criança (Assembléia Geral das Nações Unidas, 20-11-1959): “A criança tem direito a um nome e a uma nacionali¬dade”. Baseiam-se no poema-canção “Meu guri” (1981), de Chico Buarque, numa charge de Henfil e num trecho de Vidas Secas (1938), de Graciliano Ramos.

Meu guri
Chico Buarque
Quando, seu moço, nasceu meu rebento
não era o momento dele rebentar,
já foi nascendo com cara de fome
e eu não tinha nem nome pra lhe dar.
Como fui levando, não sei lhe explicar
fui assim levando, ele a me levar,
e, na sua meninice, ele um dia me disse
que chegava lá. Olha aí, olha aí...
Olha aí, ai o meu guri, olha aí
Olha aí, é o meu guri. E ele chega.
Chega suado e veloz do batente
e traz sempre um presente pra me encabular.
Tanta corrente de ouro, seu moço,
que haja pescoço pra enfiar!
Me trouxe uma bolsa, já com tudo dentro,
chave, caderneta, terço e patuá,
um lenço e uma penca de documento
pra finalmente eu me identificar, olha aí...
[ ... ]
Chega estampado, manchete, retrato
com venda nos olhos, legenda e as iniciais.
Eu não entendo essa gente, seu moço,
fazendo alvoroço demais.
O guri no mato acho que tá rindo,
acho que tá lindo de papo pro ar.
Desde o começo eu não disse, seu moço?
Ele disse que chegava lá! Olha aí, olha aí...
Olha aí, ai o meu guri, olha aí
Olha aí, é o meu guri...
Almanaque, CD 510 010-2, PolyGram, 1993.

Mudança

“Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe, através dos galhos pelados da caatinga rala.
Arrastaram-se para lá, devagar, sinhá Vitória com o filho mais novo escanchado no quarto e o baú de folha na cabeça, Fabiano sombrio, cambaio, o aió a tiracolo, a cuja pendurada numa correia presa ao cinturão, a espingarda de pederneira no ombro. O menino mais velho e a cachor¬ra Baleia iam atrás.
Os juazeiros aproximaram-se, recuaram, sumiram-se. O menino mais velho pôs-se a chorar, sentou-se no chão.
— Anda, condenado do diabo, gritou-lhe o pai.
Não obtendo resultado, fustigou-o com a bainha da faca de ponta. Mas o pequeno esperneou acuado, depois sossegou, deitou-se, fechou os olhos. Fabiano ainda lhe deu algumas pancadas e esperou que ele se levantasse. Como isto não acontecesse, espiou os quatro cantos, zangado, praguejando baixo.”
Graciliano Ramos. Vidas secas. 64ª ed. Rio de Janeiro, Record, 1993, pág. 9.







3.1. A charge de Henfil (Henrique de Souza Filho, 1944-1988), publicada em 1977, aborda a questão da incivilizada distribuição de renda no Brasil, como causa principal da pobreza absoluta, a empurrar crianças ao desamparo das ruas, à falta de horizontes, à delinqüência. Com admirável talento e criatividade, o autor impregna de ironia o discurso de uma das personagens, por meio de um jogo entre as expressões “autor material” e “autor intelectual”. Observe atentamente o quadrinho que lhe apresentamos e responda:
a. De acordo com a charge, interprete o significado possível da expressão “autor intelectual”.
R: a.expressão “autor intelectual” no contexto, .significa o responsável indireto pelo crime, “o salário mínimo” que resume a grande causa da miséria alarmante, determinando a visão de mundo do autor material

b. Cite um elemento do plano visual da charge que caracteriza a hierarquia ou relação de poder entre as personagens em cena.
R: a estatura e a vitalidade do guarda opõem-se à magreza e a pequenez do menino.


3. 2. Um confronto entre a charge de Henfil e a letra de Chico Buarque (1944) revela algumas coincidências. Observe atentamente o menino, na charge, e as características da personagem “Meu guri”, no poema-canção e, a seguir, indique:
a. Uma característica comum a essas personagens.
R: a miséria e a criminalidade constituem características comuns a ambas as personagens.

b. Os diferentes e lamentáveis desenlaces de suas histórias pessoais.
R: Os textos representam etapas finais de uma mesma trajetória: na charge, a prisão do “menino”; no texto de Chico, a morte violenta do “guri”.

3. 3. Comparando-se a charge, “Meu guri” e o fragmento de Vidas Secas, percebe-se que, entre outras afinida¬des, há uma fundamental: a identidade daquelas crianças. Em vista deste comentário, responda:
a. Que afinidades se verificam com relação à nomeação das crianças?
R: a ausência de um nome para as crianças desses três textos revela que a despersonalização, a baixa condição econômica e a insignificância social constituem afinidades que os aproximam.

b. Cite e interprete o verso de Chico Buarque que, explicitamente, relaciona a questão da miséria com a da nomeação.
R: “e eu nem tinha nem nome pra lhe dar”. A miséria é tão absoluta que o “guri” é privado até de uma nomeação.

3.4. O chamado “ciclo nordestino” da moderna ficção brasileira compreende obras inspiradas em motivos sociais, entre os quais o flagelo das secas. São escritores representativos Rachel de Queirós (Ceará, 1910-2003), Graciliano Ramos (Alagoas, 1892-1953), José Lins do Rego (Paraíba, 1901-1957) e Jorge Amado (Bahia, 1912- ). Vidas secas focaliza uma família de retirantes que vive numa espécie de mudez introspectiva, em precárias condições físicas e num estado degradante de condição humana. Mediante estas observações:
a. Demonstre como se revela no texto essa espécie de “silêncio introspectivo” das personagens.
R: O mutismo introspectivo das personagens de Vidas Secas manifesta-se na troca brutal de informações por gestos, e não por palavras. Esse tipo de “diálogo” mostra a dificuldade de comunicação reinante no grupo de retirantes nordestinos.

b. ExpIique, com base em elementos do texto, porque Vidas Secas é considerado um romance regionalista.
R: a literatura regionalista procuta retratar uma sociedade num determinado espaço rural. os indícios de regionalismo no texto referem-se às particularidades geográficas da paisagem (“juazeiros”, “galhos da caatinga rala” ou “ a areia seca dório”), bem como ao homem do lugar, ao seu mutismo, ao seu vocabulário (“cambaio”, “aió”) . Os períodos curtos e coordenados imitam o rudimentarismo psicológico das personagens.

4. PUC-SP
a. “Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia na fronde da carnaúba; Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente, perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros; Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco aventureiro manso resvale à flor das águas.” (José de Alencar)

b. “Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe através dos galhos pelados da caatinga rala.” (Graciliano Ramos)

Os trechos acima apontam para duas maneiras de ver a realidade e indiciam dois estilos literários diferentes — o romântico e o modernista. Compare os dois e mostre:

4. a.como cada um representa a natureza:
R: O texto de José de Alencar, fragmento do roman¬ce Iracema, é um perfeito exemplo da representação romântica da natureza, dotada de emoção, traços pitorescos. Tem um caráter francamente nacional e idealizador da natureza brasileira. O segundo texto, extraído do romance Vidas secas, caracteriza a natureza em tom realista, sem idealização. Utiliza adjetivação mais enxuta, adequada à aridez do ambiente que constrói.

4. b. o conceito de regionalismo implícito no trecho b.
R: O regionalismo nordestino da segunda frise do Modernismo brasileiro representa uma tomada de consciência do escritor diante da realidade física e humana vivida pelo homem do lugar. Está assim implícito no cenário árido e sufocante sugerido pelo texto b, em que o homem submete-se à mesma miséria física da natureza.

5. Leia a afirmativa:
De maneira geral, seus romances de Graciliano Ramos caracterizam-se pelo inter-relacionamento entre as condições so¬ciais e a psicologia das personagens. Quanto à linguagem, eis algumas características apontadas pela crítica: a poupança verbal; a preferência dada aos nomes de coisas e, em conseqüência, o pouco uso do adjetivo; a sintaxe clara, em oposição ao à-vontade gramatical dos modernistas...

Trata-se de uma afirmativa falsa ou verdadeira?
R: Verdadeira

6. Atente para o texto:
Vivia longe dos homens, só se dava bem com os animais. Os seus pés duros quebravam espinhos e não sentiam a quentura da terra. Montado, confundia-se com o cavalo, grudava-se a ele. E falava uma linguagem cantada, monossilábica e gutural, que o companheiro entendia. A pé, não se agüentava bem. Pendia para um lado, para o outro lado, cambaio, torto e feio. Às vezes utilizava nas relações com as pessoas a mesma língua com que se dirigia aos brutos—exclamações, onomatopéias. Na verdade falava pouco. Admirava as palavras compridas e di¬fíceis da gente da cidade, tentava reproduzir algumas, em vão, mas sabia que elas eram inú¬teis e talvez perigosas.

Cite o tema central da obra.
R: Flagelo da seca condicionando o comportamento das pessoas animalizadas


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Testes:

1. (F. C. Chagas-SP)
O romance regionalista nordestino que surge e se desenvolve a partir de 1930, aproximadamen¬te, pode ser chamado “neo-realista”. Isso se deve porque esse romance:
a) retoma o filão da temática regionalista, descoberto e explorado inicialmente pelos realistas do século XIX.
b) apresenta, através do discurso narrativo, uma visão realista e crítica das relações entre as classes que estruturam a sociedade do Nordeste.
c) tenta explicar o comportamento do homem nordestino, com base numa postura estritamente científica, pelos fatores raça, meio e momento.
d) abandona de todo os pressupostos teóricos do Realismo do século passado, buscando as causas do comportamento humano mais no individual que no social.
e) procura fazer do romance a anotação fiel e minuciosa da nova realidade urbana do Nordeste.

2. (U.E.CE) Como em Vidas Secas, a estiagem é também enfocada nos romances:
( a ) O cortiço, de Aluísio Azevedo; e Dona Flor e seus dois maridos, de Jorge Amado
( b ) A bagaceira, de José Américo de Almeida; e O Quinze, de Rachel de Queiroz
( c ) O grande mentecapto, de Fernando Sabino; e Olhai os lírios do campo, de Érico Veríssimo
( d ) A carne, de Júlio Ribeiro; e O Ateneu, de Raul Pompéia

3. (MACK-SP) Sobre Graciliano Ramos, é incorreto afirmar que:
a) mostra-se interessado pelo comportamento, atitudes e conduta humana.
b) é o introdutor do ciclo do cacau na Literatura Brasileira.
c) tem uma visão panorâmica de seus personagens, daí resultando a conciliação da psi¬cologia com o regionalismo.
d) sua obra destaca-se pela concisão e sobriedade no estilo.
e) reproduz muitas vezes a comunicação dos sertanejos e descreve a vida desolada de seres subumanos e animalizados.

4. (PUC-MG) Quanto à narrativa de Vidas Secas, de Graciliano Ramos, a afirmativa incorreta é:
a) O código da linguagem oral é dominado por Fabiano, Vitória e os dois meninos, embora tenham idéias confusas e pensamentos desarticulados.
b) A questão existencial de ser ou não ser humano transcende o local-regional, por espelhar
um problema de cunho universal.
c) A narrativa volta-se para o drama social e geográfico do Nordeste, uma vez que trata da
questão da terra e da seca.
d) A estrutura compõe-se de capítulos justapostos: construção fragmentária que sugere um mundo percebido por manifestações isoladas.
e) Os pontos de vista são vários: a realidade é percebida e apresentada ora pelo narrador, ora pelas personagens


(Fuvest-SP) As questões de 5 a 8 baseiam-se no texto seguinte:

Pouco a pouco o ferro do proprie¬tário queimava os bichos de Fabiano. E quando não tinha mais nada para vender, o sertanejo endividava-se. Ao chegar a partilha, estava encalacrado, e na hora das contas davam-lhe uma ninharia.
Ora, daquela vez, como das ou¬tras, Fabiano ajustou o gado, arrepen¬deu-se, enfim deixou a transação meio apalavrada e foi consultar a mulher, Sinha Vitória mandou os meninos para o barreiro, sentou-se na cozinha, con¬centrou-se, distribuiu no chão semen¬tes de várias espécies, realizou somas e diminuições. No dia seguinte Fabiano voltou à cidade, mas ao fechar o negócio notou que as operações de Sinhá Vitória, como de costume, diferiam das do patrão. Reclamou e obteve explicação habitual: a diferença era proveniente de juros.
Não se conformou: devia lia engano. Ele era bruto, sim senhor, via-se perfeitamente que era mas a mulher tinha miolo. Com certeza havia um erro no papel do branco. Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu os estribos. Passar a vida inteira assim no toco, entregando o que era dele de mão beijada! Estava direito aquilo? Trabalhar como negro e nunca arranjar carta de alforria!
O patrão zangou-se, repeliu a in¬solência, achou bom que o vaqueiro fosse procurar serviço noutra fazenda.
Aí Fabiano baixou a pancada e amunhecou. Bem, bem. Não era preci¬so barulho não. Se havia dito palavra à-toa, pedia desculpa. Era bruto, não fora ensinado. Atrevimento não tinha, conhecia o seu lugar. Um cabra. Ia lá puxar questão com gente rica? Bruto, sim senhor, mas sabia respeitar os ho¬mens. Devia ser ignorância da mulher, provavelmente devia ser ignorância da mulher. Até estranhara as contas dela. Enfim, como não sabia ler (um bruto, sim senhor), acreditara na sua velha. Mas pedia desculpa e jurava não cair noutra.
O amo abrandou, e Fabiano saiu de costas, o chapéu varrendo o tijolo. Na porta, virando-se, enganchou as rosetas das esporas, afastou-se trope¬çando, os sapatões de couro cru ba¬tendo no chão como cascos.
Foi até a esquina, parou, tomou fôlego. Não deviam tratá-lo assim. Di¬rigiu-se ao quadro lentamente. Diante da bodega de seu Inácio virou o rosto e fez uma curva larga. Depois que acontecera aquela miséria, temia pas¬sar ali. Sentou-se numa calçada, tirou do bolso o dinheiro, examinou-o, procurando adivinhar quanto lhe tinham furtado. Não podia dizer em voz alta que aquilo era um furto, mas era. Tomavam-lhe o gado quase de graça e ainda inventavam juro. Que juro! O que havia era safadeza.

5. O texto, assim como todo o livro de que foi extraído, está escrito em ter¬ceira pessoa. No entanto, o recurso freqüente ao discurso indireto livre, com a ambigüidade que lhe é carac¬terística, permite ao autor explorar o filete da escavação interior, na expres¬são de Antonio Candido. Assinalar a alternativa em que a passagem é nitidamente discurso indireto livre:
a. Ao chegar a partilha, estava encala¬crado, e na hora das contas davam-lhe uma ninharia.
b. Pouco a pouco o ferro do proprie¬tário queimava os bichos de Fabiano.
c. Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu os estribos.
d. Passar a vida inteira assim no toco, entregando o que era dele de mão beijada!
e. O amo abrandou, e Fabiano saiu de costas, o chapéu varrendo o tijolo.

6. O texto, no seu conjunto, revela que Fabiano:
a. ousou enfrentar o branco provando-lhe que as contas dele estavam erradas.
b. ao perceber que era lesado, defen¬deu com êxito seus direitos.
c. conscientizou-se de que era vítima de safadeza, e conseguiu justiça.
d. concluiu que era explorado na ven¬da do gado e nas contas.
e. indignou-se com sua situação mas voltou às boas com o patrão.

7. Assinalar a alternativa que apresen¬ta orações de mesma classificação que as deste período:
Não se descobriu o erro, e Fabiano perdeu os estribos.
a. Pouco a pouco o ferro do proprie¬tário queimava os bichos de Fabiano.
b. Foi até a esquina, parou, tomou fôlego.
c. Depois que aconteceu aquela misé¬ria, temia passar ali.
d.Tomavam-Ihe o gado quase de graça e ainda inventavam juro.
e. Não podia dizer em voz alta que aquilo era um furto, mas era.


8. Assinalar a oração que começa com um adjunto adverbial de tempo:
a. Com certeza havia um erro no papel do branco.
b. No dia seguinte Fabiano voltou à ci¬dade...
c. Na porta, [ ... ] enganchou as rosetas das esporas...
d. Não deviam tratá-lo assim.
e. O que havia era safadeza.


9. (Fuvest-SP) Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos. Ordinariamente andavam pouco, mas como haviam repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas. Fazia horas que procuravam uma sombra. A folhagem dos juazeiros apareceu longe, através dos galhos pelados da caatinga rala.
Reestruturando-se o terceiro período do texto, mantém-se o sentido original apenas em:
( a ) A viagem progredira bem três léguas, uma vez que haviam repousado bastante na areia do rio seco, dado que ordinariamente andavam pouco.
( b ) haviam repousado bastante na areia do rio seco; a viagem progredira bem três léguas porque ordinariamente andavam pouco.
( c ) Porque haviam repousado bastante na areia do rio seco, ordinariamente andavam pouco, e a viagem progredira bem três léguas.
( d ) Ainda que ordinariamente andassem pouco, a viagem progredira bem três léguas, pois haviam repousado bastante na areia do rio seco.
( e ) Em virtude de andarem ordinariamente pouco e de haverem repousado bastante na areia do rio seco, a viagem progredira bem três léguas.


10. (Fuvest-SP) Sinhá Vitória falou assim, mas Fabiano resmungou, franziu a testa, achando a frase extravagante. Aves matarem bois e cabras, que lembrança! Olhou a mulher, desconfiado, julgou que ela estivesse tresvariando.

Uma das características do estilo de Vidas Secas é o uso do discurso indireto livre, que ocorre no trecho:

( a ) “Sinhá Vitória falou assim.”
( b ) “Fabiano resmungou.”
( c ) “franziu a testa”
( d ) “que lembrança” [ a ocorrência do discurso indireto livre caracteriza-se pelo fato de o discurso do narrador confundir-se com a fala ou pensamento de uma personagem. Tal recurso estilístico gera certa ambigüidade, já que não se sabe quando é o narrador ou quando é a personagem que se manifesta]
( e ) “olhou a mulher”
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Considerando a realidade nordestina, defina retirante.
R: Sertanejo que, sozinho, ou em grupo, emigra para outras regiões nacionais, fugindo à seca nas regiões áridas do NE.


Qual a característica física principal das personagens do quadro?
R: aparência raquítica e a fisionomia triste a abatida

Que indícios da seca aparecem na paisagem natural?
R: a cor do céu,o chão pedregoso














Que detalhes do quadro podem ser considerados como metonímias da fuga?
R: a trouxa de roupar qua a mulher carrega na cabeça, a trouxa que o homem carrega presa a uma vara, no ombro.

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